sexta-feira, 25 de março de 2011

UM DIA DE SETE COM POESIA (IV)


horóscopo na 2ª pessoa singular para o velho filho-da-puta plural (22 de fevereiro / 21 de fevereiro)

[amor]

um dia destes não pode falhar:
acabarás velho de tanto porno grafar
argumentando para amores a cores e flores de plástico
regando os cactos a injecções de novela domingueira
reinventando o final feliz orgástico
a jacto, detrás de outra sorte, a mesma morte
é um facto, ocultável como essa mão lampeira ou a subversão caseira
irás beijar na corda bamba até que a corda te corte

[dinheiro]

serás às tantas astronauta de pijama
umas quantas estrelas cairão no vai-vem da tua rasteira
darás por ti a aconchegar o que te é imposto na cama
afagando pontos erógenos à dinheirama
e terás corpo voraz, alma putéfia sorrateira
tremendas oleosas vontades que lutam na lama
tudo a facturar, todos a pagarem-te em fama
e ao final do dia uma pistola dourada na carteira

[trabalho]

roubar aos cegos não é fácil, mas traz-te glória
vaguearás estoicamente pela luz até se lhes apagar a memória

[saúde]

manter-se-á a propensão hereditária para pedra nos sins
agravar-se-á a reiterada vocação urticária alérgica nos nãos
não te salvará a suspensão oral por conta da contaminação da voz
(nenhuma erva coragem tisana te subtrai à merda voragem tirana)
não nem serás tu a subscrever o sim
sim nem serás tu a atalhar pelo não
aplicarás cirurgicamente a pastilha da indecisão
aprenderás a gargarejar o tempo que se aglomera na garganta em nós
a vomitar audivelmente público o entretanto após
de tão peçonhento hálito saberás
xarope nenhum te purgará a inaptidão para respirar fundo nos jardins
não há pomada de espectro permeável às costuras do coração
e se fores influentemente bom rapaz
poderás tornar-te na presa viral das presas dos mastins
ou poderás morder toda a espécie que em ti pousar a mão
se fizeres o mesmo que qualquer deus faz
: tanto te fará ser osso ou cão

[amizade]

ver-te-emos a acenar ao mundo inteiro desde o palanque da praça
alguns de nós fumando coçaremos o escroto
outros quantos já finados dedicar-te-emos o voto
mas todos te acharemos a mesmíssima graça
a do filho-da-puta ignoto
e se calharmos em imprevisto cruzamento
recordaremos o passado elegante
dar-te-emos lembranças de presunto à falta de melhor assunto
que para falar doutros enchidos seria preciso dar ouvidos
e tu serás sempre bem falante
porque te saberás posicionar sempre a favor do vento


Bill enGates

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