quarta-feira, 29 de junho de 2011


Onion Tears

Há uma razão sólida que sustenta o facto de eu apreciar cozinhar sem ninguém de volta. Adoro cortar cebola. Para quem só muito raramente chora, cortar cebola é uma experiência singular e solitária, capaz de transformar o mero acto do corte cebolesco num drama shaskespeareano. É uma espécie de último e desesperado reduto para exorcizar a vontade de transformar em lágrimas aquilo que transborda da alma. Ver a alma a transbordar dos olhos é assim para o pacificador. O mesmo não se pode dizer quando transborda das palavras. Essas, por vezes, ao invés de me sossegarem, pegam em mim e levam-me para mundos subconscientes que até tenho medo de visitar. Mas hoje não se fala de palavras. Fala-se de cebolas e do seu efeito secundário. Um efeito que me obriga a acompanhar o acto da lágrima provocada pela cebola a cair, para não dar azo a dissonâncias cognitivas, e quando dou por mim estou de mão na testa, com expressões faciais várias que variam entre o desespero e o pânico, entregue a suspiros violentos e à incerta sorte do destino. Ontem foi um dia assim, com uma leve, ligeira e quase insignificante diferença: Não cortei cebola.


Bruno Vilão

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