POEMA PARA MÁRIO CESARINY
era uma coisa e depois disse que era
outra.
tinha uma profissão esquisita.
consistia em desvendar a inspiração
no interior da frase.
desvendar mas sem partir.
sem quebrar o passo e o ritmo.
e depois ele disse que via as estrelas
das coisas,
todo o cinema e brilho secreto no
espaço difuso.
um dia falou-me em paradoxos
metafóricos
e eu assustei-me como se visse vísceras
no tabuleiro da vida.
e foi então que comecei a escrever.
peguei numa palavra e depois noutra e
depois noutra.
as palavras não tinham grande
significado para mim.
eram como pedras e possibilidades.
escrevi um poema. dois. três. muitos.
e um dia ele me roubou as grandes
frases e deixou
as miudezas; tirou-me o macroscópio
e deu-me o seu microscópio de uma só
lente
para que visse as células e demais
estruturas minúsculas.
escrevi um poema sobre mim
com o poder de me fazer uma coisa e
depois outra
e depois outra.
hoje pergunto-me quem sou
e de cada vez que o faço
um poema nasce. por si só. como que
para o mestre
que nunca dorme em mim.
Sylvia Beirute