já falámos de mais
e de mais é uma árvore sem tempo
de florir
as estações sobrevoam-nos com asas prateadas
de aves formidáveis e rápidas
que nos povoam os sonhos
sem adormecer
e nós partimos do inverno enquanto
dormimos
rachamos a noite em silêncio
ao encontro da memória ágil e quente
que nos aprende a voar
sem a ciência de um rumo dizível
e nos cerca
como uma casa de sombra que brilha
por dentro da sombra
de uma mansão maior que se apaga
no interruptor da primavera
já falámos de mais
e de mais é uma árvore sem vento
de partir
há aves que ficam
à espera
do seu tempo obscuro
quando todas as penas condenam ao sol
e migram
há estações que desfalecem e se
vergam
à brisa derradeira
viciantemente fresca da solidão
no cair das folhas
o lugar plantado que somos tem uma só porta
um só chão incerto
onde se abre uma fenda de incerteza
na construção da raiz
mandei-te a chave por um pombo-correio
esquece a primavera
Renato Filipe Cardoso
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