Celebrar a vida
Uma das coisas que me atrai na
filosofia budista é a sua relação com a morte, o modo como vivem
com a consciência de que ao nascermos iniciamos de imediato o
percurso que nos levará a esse fim inevitável. No ocidente, a não
ser que sejamos muito prematuramente confrontados com a morte,
crescemos com a sensação de que esta é algo que só acontece aos
outros, aos desconhecidos. Crescemos com a sensação de que somos
imortais e sentimento só passa quando, por fim, vemos a morte
acontecer perto de nós.
Para os tibetanos a morte é tão
natural como a vida, é mesmo a sua continuação. Crescem sabendo
que a vida é apenas uma passagem e pensar na morte é para eles tão
natural como respirar. Consequentemente, valorizam a vida de um modo
totalmente diferente. Vivem-na serenamente, alheando-se de
mesquinharias.
No espaço de um ano perdi três
pessoas muito importantes para mim. Não conseguirei nunca ter a
postura da filosofia tibetana, porque não foi enraizada no meu
espírito. Contudo, a aceitação, conseguir ultrapassar o desespero,
ajuda. Não é fácil. Estas três mortes fizeram-me repensar muitos
aspectos da minha vida. Saber que caminho para um fim, faz-me querer
viver mais plenamente, mais intensamente. Não quero com isto dizer
que preciso de viver tudo o mais depressa possível. Apenas que tudo
aquilo que me proponho fazer, seja fruto de vontade inequívoca.
Quando me voltar a apaixonar, mesmo já tendo experimentado o
desalento e a dor, entregar-me-ei sem reservas a essa paixão e
correrei os riscos que tiver de correr. Estou com os amigos e
familiares que amo sempre por inteiro. Deixei de fazer fretes, porque
simplesmente não me apetece. Quando algo ou alguém me faz infeliz
ou magoa, reclamo. A vida tem de ser vivida por inteiro e não com
medos e receios. Viver pela metade, com medo de sofrer, não é
viver. Viver é celebrar, sempre.
Missanga
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