no crepúsculo do sonho
entras devagar
na casa
caiada de fresco
ternas reminiscências
(assim me pareceram na infância)
travestidas de risos e brancuras
de doces olhares
(assim me pareceram, de cores garridas)
desabam agora com o fim do dia
madeiras apodrecidas
tardes fúngicas
eclodem em apoteótica loucura
como alucinações
imagens silvantes e frias
pressentidas
naquelas manhãs que não amanheciam e
se transformavam
em dias, em meses, em anos
e tu beliscavas-te uma, outra e outra
vez
até que o sangue jorrava das tuas
veias frágeis
e teimavas, teimavas em não acreditar
que tinhas sido sempre tu
sonâmbula
que tinhas traçado o caminho de todos
os naufrágios
não, não abras a janela
não deixes que a luz se derrame sobre
a vergonha
deixa que o tempo pare
ao imaginar por um momento
que todos os amores são possíveis
não toques em nada, fica imóvel
não respires
finge que se trata de um acto solene
deixa que as correntes do passado tomem
o sono
e que em posição fetal
entre o amarfanhado morno dos lençóis
me abandone.
Catarina Pina
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