quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
EXCÊNTRICO
O meu pai era um homem alto, magro, de olhos azuis cristalinos e rosto perfeito. Era um homem estranhamente elegante que me habituei a ver à distância nos seus espaços de eleição: a sua secretária, onde lia e escrevia avidamente, e o canto do quintal, sob aquela imensa amendoeira que nunca, que me lembre, deu algum fruto.
Era um homem excêntrico, de uma excentricidade que me incomodava. Na forma de agir, de falar, de viver. Os seus hábitos escandalizavam. As suas palavras, sempre novas, deixavam-me inquieta. Era demasiado diferente dos demais para não me incomodar. Mas as suas leituras, os seus livros, os seus poemas permanecem em mim. Sinto saudades de o ver. Acordo todas as noites a olhar para os seus olhos azuis a devolverem-me um sorriso.
Não o vi morrer. Morreu sozinho. Só espero que tenha sido devagarinho, como se estivesse a adormecer.
Carmo Miranda Machado
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