quinta-feira, 22 de novembro de 2012


Caminhante, tu és o caminho! 

Depois de morrer o homem ergueu-se do cadáver e caminhou direito ao imo de si próprio. Titubeou inicialmente como se aprendesse o controlo dos músculos mas traçou sem receios, com a segurança de um cartógrafo judeu, os seus passos objectivos. Afinal a vida que acabara de perder não era mais que uma vida. Ela estava lá ao fundo. Lá junto à luz que o guiava e lhe alimentava a esperança e o esforço. Era preciso seguir o trilho sinuoso e imprevisível do labirinto. O enigma do caminho estava na dúvida que animava os seus próprios actos. Ele sabia que não havia outra maneira de continuar vivendo: teria de morrer e perder tudo para poder ganhar a eternidade. Ele teria que tentar. Teria que vencer tentando a sua paz pútrida. Teria de fazer correr pelo corpo inteiro todo o sangue, sem lutar contra o destino traçado pelas as artérias da alma.

Só ao caminhar se libertaria das cadeias da morte que a vida lhe garante. Só o cumprir desse caminho lhe aportaria a alegria redentora de um viver urgente e intenso. Só o movimento lhe fazia abrir o coração. Por força das circunstâncias executava passos rápidos, acompanhados por sístoles abertas e diástoles com pressa de viver. Só a corrida lhe aportava a paz completa de uma libertação. As correntes que arrastava, ferros pesados que lhe empecilhavam os passos, iam caindo desfeitas em ferralha. Iam ficando deixadas por terra como marcas indeléveis de um árduo trajecto cumprido em busca da uma vida. E para se libertar caminhou sem sentido até que deixou de se sentir no corpo e a sua alma se iluminou. Ao despertar, uma pomba branca e outra negra voavam por entre a névoa dos seus sonhos, ensinavam-lhe com palavras novas um mundo renascido. 


Joshua Magellan

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