sábado, 20 de agosto de 2011
Crónica Benzodiazepina
O valor do conhecido
À medida que os anos vão passando, vamo-nos apercebendo do real valor da amizade. Não dos “amigos aos molhos”, mas daqueles que correspondem com um grau de cumplicidade fundamental à nossa sanidade mental. Pode, esta ideia ser um “clichet”, sem que este facto a belisque na sua essência. Sinto isto há muito tempo. Prezo muito os meus poucos amigos. Guardo-os dentro do meu universo, onde não existe tempo nem espaço, como estrelas geradoras de órbitas, gravidade e oxigénio. Mas, tal como qualquer universo que se preze, estamos em continua expansão e surpreendo-me com a agradável constatação de ainda conseguir fazer novos amigos. Uns adquirem o estatuto, se é que assim se pode chamar, de mansinho. Pé ante pé, atingem-nos o coração. Outros não necessitam de fazer nada, dois dedos de conversa e percebemos que aquela pessoa será irremediavelmente uma amiga por afinidade até ao último dia da nossa vida. E isso é bom. Tão bom que chega a raiar o piroso. Contudo, surpreendente foi a minha mais recente descoberta - o valor fundamental dos conhecidos e o importantíssimo papel que desempenham na qualidade das nossas vidas. Não, não me refiro aos influentes, às cunhas ou aos fretes por conveniência. Refiro-me ao senhor do talho que me guarda o melhor naco de carne ou, pelo menos, caridosamente me faz crer que assim é e me chama por “vizinha” com um sorriso carinhoso. Ou ao rapaz da bomba de gasolina, que me faz sempre uma “festa” quando me vê e acena sempre que apenas passo, sem necessidade de abastecer. Não menos importante, os empregados de restauração que sabem exactamente como gosto e do que gosto, fazendo questão de o demonstrar, sabem também qual a marca do meu whisky e que marca de tabaco fumo, poupando-me a maçada de ter que meter trocos na irritante máquina costumeira. Adoro os meus conhecidos, que são cada vez mais, sem que isso me atormente, pese ou atrapalhe, bem pelo contrário. Amigos não são o oposto de conhecidos, como fui ensinada a acreditar. São relações de naturezas distintas, que não se comprometem mutuamente, nem tão pouco se opõem.
Uma constatação simples, é certo, mas ao assimilá-la do alto da sua quase estúpida e flagrante simplicidade, transformou-me num ser muito mais feliz.
Lucinda Gray
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário