sábado, 10 de dezembro de 2011

Crónica Benzodiazepina


MONOGAMIA OUTRA VEZ

O mundo não deve ser reduzido para caber na compreensão... mas a compreensão deve ser aumentada até conseguir conter o mundo. (Sir Francis Bacon, 1561-1626)

Já a minha muito querida antropóloga Margaret Mead repetia que a monogamia é a mais complicada e também a mais rara de todas as combinações maritais humanas. Há provas fortíssimas de que os seres humanos não são naturalmente monogâmicos embora possam ser. A verdade é que estudos feitos nesta área mostram que a monogamia não só é rara como difícil e quase anti-natura. E basta darmos uma voltazinha pela História, pela Literatura, pela vida... para o constatar. Já na primeira grande obra da literatura ocidental, Homero fala das consequências do adultério. Na Ilíada, para quem não se recorda ou mesmo para quem não leu, Helena, que era uma rainha grega, casadíssima, manteve uma ligação com Páris, filho do rei Príamo, de Tróia, chegando mesmo a abandonar o seu marido, Menelau, facto que precipitou a Guerra de Tróia. E era uma gaja...
Mas basta ficarmo-nos pela natureza para percebermos que biologicamente a própria monogamia é rara. Entre quase todos os mamíferos, incluindo a maioria dos primatas, a monogamia simplesmente não existe. É mesmo uma raridade. Das quatro mil espécies de mamíferos existentes, não mais do que algumas dúzias constituem pares estáveis. Parece que os morcegos (coitados, só vêem à noite), as raposas (estúpidas), os saguis (com um instrumento sexual minúsculo, pudera...), mais meia-dúzia de ratos e ratazanas... E se tivermos em conta questões biológicas como o fenómeno da competição dos espermatozóides, esta é ou não uma maneira de dizer "não à monogamia"?
Bem, voltando ao termo monogamia: este designa exclusividade de acasalamento. Mas esta exclusividade não passa de um mito, não é? Ainda que as mulheres sejam mais cuidadosas e prudentes na escolha do parceiro, e os homens significativamente menos selectivos, eles só poderão levar a sua avante se houver um número também significativo de mulheres disponíveis para tal. Certo? Por outro lado, por qualquer razão que desconheço, os homens tendem a exagerar o número de encontros sexuais e as mulheres tendem a diminuir o seu. No fundo, tudo isto se trata de uma grande e perfeita hipocrisia. A espécie humana é propensa a ela, dizendo uma coisa a respeito da monogamia e fazendo outra.
Por tudo isto, penso que a solução será aceitarmos todos, homens e mulheres, o facto de que a monogamia é um mito e pararmos com hipocrisias desnecessárias. Recordo-me de uma cena do filme "Heartburn" em que a heroína, interpretada por Meryl Streep, conta ao pai, em grande sofrimento, as infidelidades do marido e este limita-se a responder-lhe: "Queres monogamia? Casa com um cisne."
Porém, continuo a acreditar ser possível estar com um parceiro e ser-lhe fiel enquanto a relação existir e for satisfatória a todos os níveis. Mas cada vez mais assisto a situações de infidelidade quer masculina quer feminina embora, ou porque elas não contam ou porque é mesmo assim, eles ainda levem avanço... Como diz um provérbio britânico muito conhecido: "Infants have their infancy. And adults? Adultery."
 
 
Carmo Miranda Machado

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