sexta-feira, 12 de março de 2010


Reescrever O Prazer das Manhãs

É de manhã, quando fetalmente repouso entre lençois, hesitação entre a preguiça que a alma deve ao corpo e o dever que o corpo tem para com a missão que o reclama, quando sonho a vida que a dormir vivo e não vivo. É nesse momento que me redescubro:

ao sentir o cheiro a cafés e croissants que nunca beberei nem comerei, porque me alimento de sonhos e prefiro dormir;

ao ler o jornal do dia U que sairá sempre na manhã seguinte ao dia que não aconteceu e nunca me interrompe o sono, porque não é seguro que o leia ou que durma;

ao sorver aqueles odores que o sol liberta da fruta e das flores, limitando-me a aspirar o ar contaminado pelos plásticos que invadem todos os espaços que habito;

ao abrir os olhos para ver o sol nascer toda a manhã pelas frestas da janela, projectando-se contra a parede poente depois de atravessar todo o espaço do meu sonho.

Por isso, sei que o futuro é sempre o sonho do que queremos ser ou fazer (se acaso o sonhamos), ou sempre a realidade com que nunca sonhámos (se acaso o planeamos);

por isso, sei o sabor das coisas mesmo sem as provar, pois, basta-me sonhar o prazer que proporcionam para que me cresça água na boca;

por isso, sonho e assim experimento reiteradas delícias;

por isso, odeio as manhãs, de pequenos-almoços em sociedade, e apenas frequento soireés libertárias, onde encontro prazeres inusitados numa qualquer atitude déjà vu.

E por isso mesmo, fico acocorado ao lar durante o resto do dia, à espera de sonhar....

Joshua M.

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