sexta-feira, 1 de junho de 2012



A uma certa Lolita

A fugaz eternidade dos nossos felizes momentos

Julgámo-nos mal, julgámo-nos incapazes de jogar. No entanto, jogámos. Jogámos ao ar palavras de desprezo, em bocas de fel. Jogámos fora as intenções dos outros – os planos que os outros tinham para nós eram outros para nós mesmos. Atraíamo-nos como pólos opostos de cargas harmonizáveis. Jogámos ao ar os dados de um jogo perigoso: ambos perdemos o orgulho para ganhar a sorte de cálidas noites plenas de ventura. Foram noites de ácido e mel, noites de intensos silêncios sem promessas. Pelo chão, como que deitados fora por uma vida sem sentido, os nossos corpos encontravam tantos sentidos por despertar. Uma estrada branca em torrente nos levava tão longe que temíamos não conseguir encontrar o caminho de volta. Numa das mãos, segurava cautelosamente o meu fio de Ariadne; com a outra, prendia a tua mão, percorria o teu corpo fundido por toda a nudez. Um rio corria contra as margens dos nossos viveres, separando-nos tão juntos. Mergulhei na superfície fria do azul dos teus olhos quando me negavas a profundidade do teu íntimo. Emergi até à apeneia, por não poder respirar para lá do teu respirar. Apenas escuridão abaixo das palavras caladas, apenas medo sem retorno. Beijámo-nos despedidamente para não nos voltarmos a ver. Desfizemos os laços feitos pelas nossas mãos, fomos afastando o olhar até perdermos a vista um do outro no culminar do anonimato da multidão. Restaram em nós os breves e felizes momentos das nossas vidas há muito separadas. Restaram as luzes acesas nessas noites em que nos queimámos tão vivos. Ainda agora guardamos presas aos nossos olhos as estrelas, que se desfazem em centelhas quando por breves instantes nos voltamos a cruzar. 


Joshua Magellan

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