sábado, 26 de novembro de 2011
Mário de Cesariny (9 de Agosto de 1923 / 26 de Novembro de 2006)
Lago Mudo - (a)variação
Primeiro foi o Pessoa a dar o mote, ao contemplar o Lago Mudo. O Cesariny seguiu-lhe os passos em “O Virgem Negra” para explicar as palavras do poeta dos heterónimos às criancinhas naturais e estrangeiras. E eu, como uma criança invejosa que do canto do pátio do recreio observa os dois a jogarem às palavras, ávido por entrar no labirinto lúdico das letras, sinto-me impelido a perguntar-lhes, quase em surdina: “Também posso brincar?”.
O oblíquo olhar que me lançam é revelador de uma cúmplice desconfiança, como quem pensa: “Mas quem és tu, que ousa poder dar continuidade à tradução da explicação do Lago Mudo?”. A verdade é que acharam piada ao arrojo e os sinais que recebi deram-me alento para decifrar às criancinhas virtuais e matreiras, a explicação do Cesariny sobre o "Lago Mudo", do Pessoa. Então, e só então, atrevi-me a contemplá-lo, também:
Contemplo o lago mudo
Que uma brisa revolve
Não sei se culpo tudo
Ou se tudo me absolve.
A brisa não me conforta
E o lago é uma visão distante
Não sei se leio em linha torta
Ou se me enleio no instante.
Trémulos vincos enfadonhos
Não sei se de vinda se de ida
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única saída?
Para quem não conhece ou quiser recordar o original do Pessoa, aqui está:
Contemplo o lago mudo
Que uma brisa estremece.
Não sei se penso em tudo
Ou se tudo me esquece.
O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo
Não sei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo.
Trémulos vincos risonhos
Na água adormecida.
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única vida?
Assim como o “cover” do Cesariny:
Contemplo o lago mudo
Que uma brisa sacode.
Não sei se fodo tudo
Ou se tudo me fode.
A brisa é o lago a ir
A uma ideia de mar.
Não sei se me ate a rir
Ou desate a chorar.
Trémulos vincos medonhos
Cercando a água toda,
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única nódoa?
Bruno Vilão
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