Aprecie com moderação
Encontrei-a na manifestação. Disse-me
que havia sentido em todo aquele ato comunista, no futuro, haveria
anarquistas e seria importante saber quem é quem. Joguei os dados,
esses não disseram nada, absolutamente nada. Ah, recordo-me daquela
professora que ressaltava na faculdade o quanto eram anarquistas os
que não eram disciplinados. Aprendi bem o bê-á-bá; na infância
era a casinha feliz. Cada qual mora onde pode, o alfabeto é reto,
não tem k, w, y, dá saltos, dribla obstáculos. É árduo, doutora
- enquanto a senhora reduz nossos danos, o feitiço vira contra o
feiticeiro. Somos todos aprendizes.
- O pernil está servido.
- Sim continue.
- Não vai devorar?
- Não como carne.
- Os judeus também têm certas
condutas.
Eu sou um autêntico glutão das
letras, escreva um artigo, leia-o no mais tardar, verás nada, coisa
nenhuma. Ciladas do tempo.
- São tantos deuses, não é mesmo?
- Sou ateu
- Esqueci-me disso. Isso é religioso?
- O quê?
- O projeto, de vida.
- Social.
- Entendo.
- Você usa câmera?
- Não entendo de imagens.
- Sei.
- Um agente secreto.
- Cachorros curam suas feridas com
saliva, você sabia?
- Não como cachorros.
- Resposta quente. Tem quem o faça,
nem loucos, nem insanos. Acredite.
- Aceita um cafezinho?
- Sim, sem cafeína, por favor.
- Sinta-se à vontade.
Ó estrangeiro, ó peregrino, ó
passante de pouca esperança - nada tenho para te dar, também sou
pobre e estas terras não são minhas. Mas aceita um cafezinho. A
poeira é muita, e só Deus sabe aonde vão dar esses caminhos. Um
cafezinho, eu sei, não resolve o teu destino; nem faz esquecer tua
cicatriz. Mas prova... Bota a trouxa no chão, abanca-te nesta pedra
e vai preparando o teu cigarro. Um minuto apenas, que a água está
fervendo e as xícaras já tilintam na bandeja. Vai sair bem coado e
quentinho. Não é nada, não é nada, mas tu vais ver: serão mais
alguns quilômetros de boa caminhada. E talvez uma pausa em teu
gemido!
Um minutinho, estrangeiro, que teu café
já vem cheirando...
Manuela Barreto (Brasil)
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