Para a Elisabeth Correia
Todo o sonho de uma vida
Resguardada numa hibernação lenta,
longa, vivia dentro de si como uma larva que teima em tardar no interior do seu
casulo. Aperfeiçoando a vida, aperfeiçoando-se até ao infinito.
Lá, no infinito, habitaria o lugar de um novo estádio, uma tumba
feita berço onde haveria de desnascer para renascer. Fazia durar o
seu percurso por aquela fase de vida quase vida, o calor do seu íntimo acomodava-a como uma poltrona. Teimava em não ser crisálida,
teimava em guardar-se nos pensamentos que a protegiam do mundo. Lá
fora tudo era agreste e impiedoso, até o próprio tempo ao passar
queimava doendo. Quando saía de si era impermeável ao viver das
gentes, apenas os olhos saíam para desfrutar do panorama do mundo.
Quando caminhava reservadamente pelas ruas era apenas uma visão,
uma aura que dissimulava a sua presença. Nunca quis ser vista, nunca
quis ver ou inteleger para além do mundo sensível. Para além,
sentia apenas o escuro, o inseguro, o intangível, o que não era
para si um mundo seu. Mas, haveria de conseguir sobreviver às provações quotidianas, de subsistir para ganhar nova forma. Haveria
de criar asas, asas suficientemente fortes para se ultrapassar. Um
dia haveria de querer viajar, sobrevoar o tempo e a vida, chegar
aonde o mundo fizesse outro sentido. Ela sabia de cor os lugares
bonitos da vida, aprendera-os todos com os livros no coração. As
palavras dos sábios ensinaram-lhe muitas coisas preciosas, emoções
que nem o amor. Era nessas emoções que podia assistir aos mais
belos lugares. Quando pudesse adejar sobre eles, visitá-los-ia, um
por um, com os olhos sedentos de novidade e a mente escancarada.
Esperava chegar um dia esse dia futuro, senti-lo-ia quando o mundo já
não doesse e a terra lhe abrisse os braços. As suas asas cresceriam
finalmente. Ver-se-ia mariposa espelhada nas águas. E voaria, voaria
sobre todas as mágoas, voaria até ao topo de um sonho tão efémero quanto a sua existência.
Joshua Magellan
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