sexta-feira, 18 de junho de 2010


O Vulto

De repente, um vulto entra. Pára a um canto na sombra. A luz da taberna, debilitada, não me deixa ver-lhe mais do que as costas largas, deduzo-lhe a magreza e o ar sombrio que desponta pelo perfil fugidio. Senta-se, silencioso e misterioso. Ao virar-se para o empregado, algo me prende o olhar naquela figura. Aquele rosto, o seu ar sinistro evocam-me uma noite que não esqueço. O copo de água ainda espera por mim e um garoto amarelecido atrás do balcão, por sua vez, observa-me. Nada me abstrai do vulto. Continua a imiscuir-se a sua imagem na minha memória até que as linhas finas e desenhadas do seu rosto se matizam numa outra imagem que se define aos poucos. Sim, foi ele. Foi este homem que, naquela noite de há treze anos, me surpreendeu com um pequeno papel. Nele estava escrita a combinação de números da Lotaria seguinte.


Berenice Greco

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