sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

PALAVRA EXPERIMENTAL (XII)


Merdas soltas 

Muito pouco, ou nada, sei de mim. Conheço-me há muito pouco tempo, mas dou-me bem comigo. Quero dizer: com a maior parte do que sou intimamente.

Procuro-me no céu em todas aves e nunca obtenho a liberdade num voo circundante. Antes a maré em vez do ar, antes o voo direito ao fundo de onde hei-de lançar a subida.

Não, não sei que te diga, não sei que possa não deixar de te dizer. Por isso não digo, não digo o que guardo e só é meu. E dói-me...

A traição é um grito numa igreja em silêncio. É a fé, quando ultrajada, o descanso e a paz das almas a ser perturbada. Deixem dormir os fiéis!

O sangue dos traidores corre sempre azul, sempre celeste. Depois de ferir prostram os olhos no escorrer do céu e dizem indecências agarrados ao prazer de trair. Sim, há prazer em ferir.

Quando partimos agarrados às memórias, com recordações por todas as malas, chegamos onde todo o pó assentou sobre a casa da infelicidade. Somos infelizes e repetimos.

Nessa casa-vida, onde habitamos precocemente, vamos guardando todas as lembranças como um atestado oficial de vividos. Vivemos? Será que vivemos?

Nunca entendi o mal, o que está por dentro de quem faz o mal. Apenas sinto por fora o corpo frio da vingança contra mim, um ódio lâmina a percorrer-me agudamente o medo. Um medo sentido até ao fim, como um arremedo de morte.

É o diabo, por dentro do corpo, que se agita num arrepio de onda. É o mar Adamastor a erguer-se esquálido no Averno das nossas vidas em fuga. E, em cada vaga, vamos morrendo, aos poucos, aos poucos...


Joshua Magellan

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