segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

SETE DIAS VEZES POESIA (VII)

 

no corpo de um outro tempo

como se o tempo fosse linear e recto
as noites descessem sobre os dias
um tempo simples
um ponteiro em movimento
uma roda eterna

como se o meu corpo fosse uma casa
um rectângulo perfeito
em cada parede o silêncio
uma janela

coincidência entre tempo imaginado e vivido
estanquidade deste mundo onde a estranheza não tem lugar
onde todos os rios fluem no mesmo sentido
estendo a minha mão e quase lhes toco
sangue corrente em minhas veias
este tempo igual este lugar de lagos imutáveis
tempo único
tempo alinhado
 
quis habitar uma casa
desenhar a minha sombra no papel das paredes
olhar-me num espelho
sílaba a sílaba repetir o meu nome
em cada sílaba, em cada repetição, aumentar a distância
o olhar de volta ao espelho
fixa a imagem
mas aquele eu já não era meu
o sentido da palavra perdera-se
os olhos eram apenas olhos
arquétipos
o movimento dos lábios indiferente ao rolar das pedras
estilhaços pelo chão da casa imaculada
reflexos de um corpo fragmentado em pedaços
hemisférios divergentes
vários tempos contidos no mesmo tempo

memórias da ausência
as paredes brancas de uma casa em ruínas
tempos múltiplos se iniciavam
 
hoje os corpos dançam
abraçam-se
como corpos que se abraçam 
dançando

vogam indiferentes à passagem do tempo
cada movimento é eterno
indelével
há uma torrente contínua
sílabas acompanhando sílabas
vidas acrescentando vidas
vozes ecoando vozes
encerra o mundo inteiro o nosso corpo
em todas as vidas em todos os tempos
todos os tempos entre nós ao mesmo tempo
o nosso corpo único
ainda silábico.


Catarina Pina




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