quinta-feira, 23 de setembro de 2010

BLOGONOVELA "O GUARDADOR DE VARAS" - Episódio IV


O GUARDADOR DE VARAS (IV)

Como já antes andavam deveras apreensivos com a sanidade mental dos animais, a que alguns habitantes de aldeias mais próximas atribuíam práticas homossexuais e de bruxaria, desta feita os populares ficaram extremamente preocupados. Tó era, sem dúvida, um bom negócio para eles, mas o tratamento dos porcos estava cada vez menos convencional. Assim, aproveitaram as futuras visitas para se reaproximarem do moçoilo e tentar convencê-lo de que aquilo não era normal, que ele não era um porco e sim um ser humano (fosse lá o que isso fosse), e etc. e tal, blá blá blá blá blá.
Depois de tanto baterem no ceguinho — um tal de Orwell que nunca estava de acordo com nada do que se dizia —, lá acabaram por fazer com que Tó fosse consultar um médico. Aliás, para pagar a dita ao senhor doutor, toda a aldeia se juntou para fazer uma porquinha.
Numa tarde chuvosa de Fevereiro, chegou à povoação vizinha do Forno e, embora contrafeito e renitente, lá acabou por fazer soar a estridente campainha do doutor Costa Leta, reputado veterinário da região. O médico deu voltas e voltas, consultou compêndios, manuais e simpósios, mas no final lamentou muito, pois na verdade nada havia que estivesse ao seu alcance fazer por Tó. Por isso, pendurou o estetoscópio, lavou daí as mãos e, por mera cortesia comiserada, convidou o doente para jantar em sua casa, para a qual se retirou de imediato, profissionalmente frustrado. Afinal, em 40 anos de medicina nunca antes falhara em ajudar um paciente. “A vida é uma porca”, ruminava de si para si.


Bill enGates

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