sexta-feira, 16 de julho de 2010

SETE DIAS SETE PECADOS - A AVAREZA (II)


O Apelo de Mammon

Numa fila interminável, espero pela minha única refeição decente do dia. Todos os dias, à mesma hora, repete-se este ritual. É precisamente neste momento que assombra na minha mente o motivo que me levou a esta situação. Enquanto aguardo a minha vez, a história da minha vida desenrola-se como uma fita cinematográfica à velocidade da luz.
Tinha vindo para Nova Iorque trabalhar como bancário na City, a mudança para um dos centros económicos mais importantes do mundo, permitir-me-ia estabelecer contactos com o mundo da alta finança e, assim, enriquecer mais facilmente.
Observava diariamente o modus vivendi da alta burguesia que transpirava glamour e sumptuosidade através da acumulação de fortuna. Era esse o meu sonho, ter para ser respeitado e admirado.
Alguns meses após, conheci, num café em frente ao banco, Lisie, uma bibliotecária. Começámos a sair frequentemente e após algum tempo iniciámos uma relação. Apesar de gostarmos um do outro, tínhamos perspectivas de vida algo diferentes; Lisie não ligava muito ao dinheiro, gostava saber mais e mais, por isso, nunca saia da biblioteca sem requisitar um livro.
Quanto a mim, estava completamente absorvido no mundo dos dólares, e começara a entender de que forma poderia aumentar a minha reserva de ouro sem muito esforço.
Comecei por ir algumas vezes a Wall Street para perceber como funcionava o mercado das acções. Pouco tempo depois, apreendi a lógica deste mercado, muito próspera e rápida. Assim que acumulei algum capital, resolvi começar a investir em acções, e ia diariamente à Bolsa de Valores. Numa das vezes que estava com Lisie, conversava sobre as minhas aplicações financeiras, aliás, era sempre eu a falar da mesma coisa, até que ela, com um sorriso algo irritado, retorquiu: - Mammon tem-te visitado muitas vezes!? Não entendendo aquela afirmação, fiquei algo intrigado, e pedi-lhe que me elucidasse. Após longa explanação acerca daquela criatura, em tom de crítica respondi: - Essas historietas não passam disso mesmo! A sabedoria não dá lucro! Lisie terminou dizendo: - Não há maior riqueza do que a acumulação de conhecimento.
Naquele fatídico dia – 29 de Outubro de 1929 – relembrei aquele diálogo áspero, acabara de perder todas as minhas economias naqueles malfadados títulos da Bolsa. Tudo o que agora possuía era um monte de papéis sem qualquer valor. A crise instalou-se e ambos ficámos desempregados. Lisie voltou para a sua terra natal e eu fiquei a deambular pelas ruas de Nova Iorque esperando por melhores dias.
Agora sentado, com o tabuleiro à minha frente, olho fixamente para uma imagem numa dessas acções que guardei. Sim, é mesmo Mammon com o seu ar imperial a seduzir-me: I want you!

M. Jota

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